Algoritmo
quântico é mais eficaz do que análogos clássicos
NASA Ames/John Hardman
Computador quântico: estudo foi conduzido por pesquisadores turcos e
brasileiros e publicado na revista Scientific Reports
José Tadeu
Arantes, da
O computador quântico poderá deixar de ser um sonho e se tornar realidade nos
próximos 10 anos. A expectativa é que isso traga uma drástica redução no tempo
de processamento, já que algoritmos quânticos oferecem soluções mais eficientes para certas tarefas
computacionais do que quaisquer algoritmos clássicos correspondentes.
Até agora, acreditava-se que a chave
da computação quântica eram as correlações entre dois ou mais sistemas. Exemplo
de correlação quântica é o processo de “emaranhamento”, que ocorre quando pares
ou grupos de partículas são gerados ou interagem de tal maneira que o estado
quântico de cada partícula não pode ser descrito independentemente, já que
depende do conjunto (Para mais informações veja agencia.fapesp.br/20553/).
Um estudo recente mostrou, no
entanto, que mesmo um sistema quântico isolado, ou seja, sem correlações com
outros sistemas, é suficiente para implementar um algoritmo quântico mais
rápido do que o seu análogo clássico.
Artigo descrevendo o estudo foi
publicado no início de outubro deste ano na revista Scientific Reports, do
grupo Nature: Computational speed-up with a single qudit.
O trabalho, ao mesmo tempo teórico e
experimental, partiu de uma ideia apresentada pelo físico Mehmet Zafer Gedik,
da Sabancı Üniversitesi, de Istambul, Turquia. E foi realizado mediante
colaboração entre pesquisadores turcos e brasileiros.
Felipe Fernandes Fanchini, da
Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista (Unesp), no campus de
Bauru, é um dos signatários do artigo. Sua participação no estudo se deu no
âmbito do projeto Controle quântico em sistemas dissipativos, apoiado pela
FAPESP.
“Este trabalho traz uma importante
contribuição para o debate sobre qual é o recurso responsável pelo poder de
processamento superior dos computadores quânticos”, disse Fanchini à Agência
FAPESP.
“Partindo da ideia de Gedik,
realizamos no Brasil um experimento, utilizando o sistema de ressonância
magnética nuclear (RMN) da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos.
Houve, então, a colaboração de pesquisadores de três universidades: Sabanci,
Unesp e USP. E demonstramos que um circuito quântico dotado de um único sistema
físico, com três ou mais níveis de energia, pode determinar a paridade de uma
permutação numérica avaliando apenas uma vez a função. Isso é impensável em um
protocolo clássico.”
Segundo Fanchini, o que Gedik propôs
foi um algoritmo quântico muito simples que, basicamente, determina a paridade
de uma sequência.
O conceito de paridade é utilizado
para informar se uma sequência está em determinada ordem ou não. Por exemplo,
se tomarmos os algarismos 1, 2 e 3 e estabelecermos que a sequência 1- 2-3 está
em ordem, as sequências 2-3-1 e 3-1-2, resultantes de permutações cíclicas dos
algarismos, estarão na mesma ordem.
Isso é fácil de entender se
imaginarmos os algarismos dispostos em uma circunferência. Dada a primeira
sequência, basta girar uma vez em um sentido para obter a sequência seguinte, e
girar mais uma vez para obter a outra.
Porém, as sequências 1-3-2, 3-2-1 e
2-1-3 necessitam, para serem criadas, de permutações acíclicas.
Então, se convencionarmos que as três
primeiras sequências são “pares”, as outras três serão “ímpares”.
“Em termos clássicos, a observação de
um único algarismo, ou seja uma única medida, não permite dizer se a sequência
é par ou ímpar. Para isso, é preciso realizar ao menos duas observações. O que
Gedik demonstrou foi que, em termos quânticos, uma única medida é suficiente
para determinar a paridade. Por isso, o algoritmo quântico é mais rápido do que
qualquer equivalente clássico. E esse algoritmo pode ser concretizado por meio
de uma única partícula. O que significa que sua eficiência não depende de
nenhum tipo de correlação quântica”, informou Fanchini.
O algoritmo em pauta não diz qual é a
sequência. Mas informa se ela é par ou ímpar. Isso só é possível quando existem
três ou mais níveis. Porque, havendo apenas dois níveis, algo do tipo 1-2 ou
2-1, não é possível definir uma sequência par ou ímpar.
“Nos últimos tempos, a comunidade
voltada para a computação quântica vem explorando um conceito-chave da teoria
quântica, que é o conceito de ‘contextualidade’. Como a ‘contextualidade’
também só opera a partir de três ou mais níveis, suspeitamos que ela possa
estar por trás da eficácia de nosso algoritmo”, acrescentou o pesquisador.
Conceito de contextulidade
“O conceito de ‘contextualidade’ pode
ser melhor entendido comparando-se as ideias de mensuração da física clássica e
da física quântica. Na física clássica, supõe-se que a mensuração nada mais
faça do que desvelar características previamente possuídas pelo sistema que
está sendo medido. Por exemplo, um determinado comprimento ou uma determinada
massa. Já na física quântica, o resultado da mensuração não depende apenas da
característica que está sendo medida, mas também de como foi organizada a
mensuração, e de todas as mensurações anteriores. Ou seja, o resultado depende
do contexto do experimento. E a ‘contextualidade’ é a grandeza que descreve
esse contexto”, explicou Fanchini.
Na história da física, a
“contextualidade” foi reconhecida como uma característica necessária da teoria
quântica por meio do famoso Teorema de Bell.
Segundo esse teorema, publicado em
1964 pelo físico irlandês John Stewart Bell (1928 – 1990), nenhuma teoria
física baseada em variáveis locais pode reproduzir todas as predições da
mecânica quântica. Em outras palavras, os fenômenos físicos não podem ser
descritos em termos estritamente locais, uma vez que expressam a totalidade.
“É importante frisar que em outro
artigo [Contextuality supplies the ‘magic’ for quantum computation] publicado
na Nature em junho de 2014, aponta a contextualidade como a possível fonte do
poder da computação quântica.
Nosso estudo vai no mesmo sentido,
apresentando um algoritmo concreto e mais eficiente do que qualquer um jamais
imaginável nos moldes clássicos.”
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